Florbela d’Alma da Conceição Espanca (1894-1930), nome adotado por Flor Bela Lobo, foi uma poetisa e um dos mais importantes nomes da Literatura Portuguesa de sempre. Nas suas escritas abordou temas como amor, erotização, angústia e sofrimento. Trouxe a figura feminina para as suas obras.
A poetisa portuguesa teve duas antologias publicadas em vida: Livro de mágoas em 1919 e Livro de sóror saudade em 1923. Outras três foram lançadas postumamente: Charneca em flor (1931), Juvenília (1931) e Reliquiae (1934). Além da poesia, Florbela Espanca escreveu para jornais e traduziu obras literárias.
Primeiras obras de Florbela Espanca
Nascida em Vila Viçosa, na região centro-sul de Portugal, Florbela perdeu a mãe muito cedo. Filha ilegítima de João Maria Espanca, foi registada como se tivesse pai desconhecido e com o nome de Flor Bela Lobo. Foi, no entanto, criada pelo pai e pela esposa, Mariana Espanca.
Entre os anos de 1899 e 1908, Florbela Espanca frequentou uma escola em Vila Viçosa e, já nessa época, começou a escrever os seus primeiros textos. Assinava seus trabalhos como Flor d’Alma da Conceição.
Escreveu o primeiro poema entre 1903 e 1904: “A vida e a morte”. Na mesma época, fez um soneto em homenagem ao seu irmão Apeles e um texto para o aniversário do pai. O primeiro conto escrito por ela foi “Mamã!”, em 1907, sobre a sua mãe biológica, que morreria um ano depois.
Mais tarde, em 1916, fez uma coletânea com 85 poemas e três contos, textos que integraram o projeto “Trocando olhares”. A poeta não teve sucesso nas tentativas de tornar a sua obra conhecida, mas o que foi escrito serviu de base para trabalhos futuros.
As primeiras vendas de Florbela aconteceram em 1919. O Livro de mágoas teve duzentos exemplares publicados, os quais foram vendidos rapidamente.
A primeira obra oficial foi composta por sonetos. A segunda coletânea de sonetos foi publicada em 1923. Livro de sóror saudade foi uma obra paga pelo pai de Florbela.
Importância para o Feminismo
Apesar de não levantar bandeiras sociais como o Feminismo, Florbela é considerada uma mulher à frente do seu tempo, vencendo algumas barreiras da sociedade portuguesa da época. Foi uma das primeiras a frequentar o curso secundário no Liceu Masculino André de Gouveia, em Évora.
Posteriormente, Florbela foi a primeira mulher a entrar no curso de Direito da Universidade de Lisboa. Formou-se também em Letras.
Num meio dominado por homens, a poetisa foi colaboradora do jornal D. Nuno, de Vila Viçosa, dirigido por José Emídio Amaro, em 1927.
O pioneirismo e a independência feminina de Florbela Espanca também estiveram presentes na sua vida pessoal. Foi casada três vezes, coisa incomum para as mulheres da época.
Intensa, Florbela abordou o erotismo em parte dos seus sonetos. A poeta mostrou que o tema poderia ser tratado por mulheres, um enorme tabu no início do século XX.
Suicídio
Em 1927, Florbela Espanca perdeu o irmão. Apeles morreu num acidente de avião, o que marcou a vida da poetisa até o fim. Em sua homenagem, escreveu um conjunto de contos no livro As máscaras do destino, publicado somente em 1931, após a morte da portuguesa.
Cada vez mais debilitada pelo falecimento do irmão, Florbela tentou suicidar-se por três vezes. Falhou nas duas primeiras, a terceira foi fatal.
Morreu com 36 anos, no dia do seu aniversário, a 8 de dezembro de 1930, na cidade de Matosinhos, com uma overdose de barbitúricos.
Obras póstumas de Florbela Espanca
No meio do sofrimento que resultou no seu suicídio (1930), Florbela escreveu o Diário do último ano. A obra foi apenas publicada em 1981.
Charneca em flor, escrita por volta de 1927, só foi publicada em 1931.
Vários sonetos e poemas foram publicados postumamente, incluídos em Juvenília (1931) e Reliquiae (1934).
Guido Batteli, professor italiano de Literatura na Universidade de Coimbra, reuniu toda a obra de Florbela num volume com o título Sonetos completos, publicado em 1934. Diversas edições foram lançadas posteriormente.
Poemas de Florbela
A escritora foi intensa, e isso é percetível em trabalhos como “A vida e a morte”, o seu primeiro poema. Apesar de ter sido escrito quando Florbela ainda era criança, com apenas 9 anos de idade, o texto já demonstrava toda a sua essência.
A vida e a morte *
O que é a vida e a morte
Aquela infernal inimiga
A vida é o sorriso
E a morte da vida a guarida
A morte tem os desgostos
A vida tem os felizes
A cova tem a tristeza
E a vida tem as raízes
A vida e a morte são
O sorriso lisonjeiro
E o amor tem o navio
E o navio o marinheiro
Eu… **
Eu sou a que no mundo anda perdida,
Eu sou a que na vida não tem norte,
Sou a irmã do Sonho, e desta sorte
Sou a crucificada … A dolorida…
Sombra de névoa tênue e esvaecida,
E que o destino amargo, triste e forte,
Impele brutalmente para a morte!
Alma de luto sempre incompreendida!…
Sou aquela que passa e ninguém vê…
Sou a que chamam triste sem o ser…
Sou a que chora sem saber porquê…
A morte tem os desgostos
A vida tem os felizes
A cova tem a tristeza
E a vida tem as raízes
Sou talvez a visão que Alguém sonhou,
Alguém que veio ao mundo pra me ver,
E que nunca na vida me encontrou!