O Bacalhau à Gomes de Sá é um prato tradicional da culinária portuguesa que conquistou paladares ao redor do mundo. Esta receita tem uma história rica e cativante, mergulhada nas tradições gastronómicas de Portugal.
Origem do Bacalhau à Gomes de Sá
A história do Bacalhau à Gomes de Sá remonta ao século XIX. Acredita-se que o prato tenha sido criado pelo comerciante e cozinheiro portuense José Luís Gomes de Sá. Com a abundância de bacalhau nas águas portuguesas e a necessidade de criar pratos sustentáveis, Gomes de Sá desenvolveu essa receita única que combina a simplicidade dos ingredientes com sabores intensos.
“Glória da culinária portuguesa”, é assim que a placa colocada na casa onde nasceu José Luís Gomes de Sá, no Porto, celebra o bacalhau por ele inventado. Farto de fazer bolinhos de bacalhau, Gomes de Sá pegou nos mesmos ingredientes e criou um prato novo.
Quem foi José Luís Gomes de Sá
José Luís Gomes de Sá Júnior nasceu a 7 de fevereiro de 1851, numa casa situada na Rua do Muro dos Bacalhoeiros, no número 114.
José Luís Gomes de Sá Júnior viria a falecer em 1926. Ainda que muitas vezes adulterado, a sua criação ganhou fama por cá e além-fronteiras. Por exemplo, no Brasil onde é muito apreciado, graças à imigração portuguesa pós-colonial, sobretudo depois dos meados do século XIX. Em vários mercados do Brasil, o bacalhau é vendido como “Bacalhau do Porto”. Por cá, o prato foi um dos candidatos finalistas às Sete Maravilhas da Gastronomia portuguesa, o que revela a sua grande importância para a culinária portuguesa, bem como o seu valor gastronómico em Portugal. Além de ser um hábil comerciante, Gomes de Sá destacou-se como cozinheiro, deixando um legado culinário que perdura até os dias de hoje.
A Receita Original de José Luís Gomes de Sá
A receita original do Bacalhau à Gomes de Sá é uma ode à simplicidade e à qualidade dos ingredientes. Gomes de Sá combinava lascas de bacalhau cozido com batatas, cebolas, alho, azeite e salsa fresca, resultando em um prato reconfortante e delicioso.
A qualidade desta receita obtém-se, em boa parte, pela qualidade dos ingredientes envolvidos, que devem ser, cuidadosamente, selecionados. Deve-se utilizar leite magro e não leite meio-gordo ou leite gordo, para não ser enjoativo, no amaciamento das lascas de bacalhau. E, sobretudo, o bacalhau (que tem de ser sempre bacalhau-do-atlântico, Gadus morhua) de postas grossas, de salga lenta e cura amarela) e o azeite devem ser de muito boa qualidade para se obter o sabor original da receita, que tem sido desvirtuada nas últimas décadas, pela grande maioria dos restaurantes, com receitas que se afastam da original e/ou que utilizam ingredientes com pouco qualidade orgânica. Muitas dessas receitas, que se afastam da original, também são publicitadas nas redes sociais, o que leva o consumidor comum a confundir essas falsas receitas com a original de José Luís Gomes de Sá.
Ingredientes:
- postas de Bacalhau demolhado
- Batata
- dentes de alho
- cebolas
- ovos cozidos
- azeite q.b.
- salsa q.b.
- azeitonas pretas a gosto
- leite magro q.b.
Preparação, segundo a receita original de José Luís Gomes de Sá Júnior:
“Pega-se no bacalhau demolhado e deita-se numa caçarola. Depois, cobre-se tudo com água a ferver, e, depois, tapa-se com uma baeta grossa ou um pedaço de cobertor e deixa-se, então, assim, sem ferver, durante 20 minutos. A seguir, ao bacalhau que está na caçarola e que devem ser 2 quilos pesados em cru, tiram-se-lhe todas as espinhas e faz-se em lascas e põe-se num prato fundo, cobrindo-se com leite quente, deixando-o, em infusão, durante uma hora e meia a duas horas. Depois, em uma travessa de ir ao forno, deita-se três decilitros de azeite fino do mais fino (isto é essencial), quatro dentes de alho e oito cebolas a alourar. Ter já dois quilos de batatas (cortadas, à parte, com casca) às quais se lhes tira a pele e se cortam às rodelas da grossura de um centímetro e bota-se as batatas mais as lascas do bacalhau, que se retiram do leite. Põe-se, então, na mesma travessa, no forno, deixando-se ferver tudo, por dez a quinze minutos. Serve-se, na mesma travessa, com azeitonas grandes pretas, muito boas, e mais um ramo de salsa muito picada e rodelas de ovo cozido. Deve-se servir bem quente, muito quente.”
A receita é retirada de um manuscrito, atribuído ao próprio José Luís Gomes de Sá, que ao vender a receita ao amigo, João, cozinheiro do Restaurante Lisbonense, deixou a seguinte nota: “João, se alterar qualquer coisa, já não fica capaz”. O aviso de que “Deve-se servir bem quente, muito quente” também tem de ser sempre, impreterivelmente, cumprido, para que o prato tenha qualidade.
Receita Contemporânea
Ao longo dos anos, a receita do Bacalhau à Gomes de Sá evoluiu, incorporando variações e adaptações. Algumas versões contemporâneas podem incluir ingredientes adicionais, como pimentos, ovos cozidos e azeitonas, adicionando camadas de sabor e textura ao prato.
A Importância do Restaurante Lisbonense, no Porto, para o Bacalhau à Gomes de Sá
O Restaurante Lisbonense, situado no coração do Porto, desempenhou um papel crucial na popularização do Bacalhau à Gomes de Sá.
Cinquenta mil réis. Terá sido esta a quantia que o proprietário do restaurante Lisbonense, na Travessa dos Congregados, no Porto, pagou pela receita original do Bacalhau à Gomes de Sá. Isto passou-se no início do século XX. Um século depois, o prato inventado por José Luís Gomes de Sá (1851-1926), conseguiu vencer vários concorrentes de peso e apresentar-se entre os 21 finalistas do concurso para escolher as sete maravilhas gastronómicas de Portugal.
Citação de Aquilino Ribeiro
Aquilino Ribeiro, ilustre escritor português, descreveu o Bacalhau à Gomes de Sá como “um poema em cada garfada, uma viagem aos sabores autênticos de Portugal”. Sua apreciação pela culinária portuguesa, especialmente este prato, ecoa o sentimento de muitos amantes da boa comida.
Carta de José Luís Gomes de Sá ao Amigo João
Numa carta preservada ao longo dos anos, José Luís Gomes de Sá escreveu ao seu amigo João sobre a criação do Bacalhau à Gomes de Sá. Nessa carta descreveu detalhadamente a combinação de ingredientes e técnicas que resultaram na receita icónica, revelando seu amor pela gastronomia e o desejo de partilhar essa delícia com o mundo.
Em suma, o Bacalhau à Gomes de Sá transcende fronteiras e gerações, mantendo-se como um símbolo da riqueza gastronómica de Portugal. A receita continua a ser apreciada por aqueles que procuram uma experiência culinária autêntica, conectando-se ao legado deixado por José Luís Gomes de Sá.